“Segurança Pública: o Grande Paquiderme da Sociedade Brasileira”

O modelo de segurança pública brasileiro tem na Constituição Federal o incentivo da continuidade da ineficiência que hoje é marca maior da sua funcionalidade. Se fizermos uma leitura mais detalhada do artigo 144 da nossa Carta Magna, iremos perceber que este artigo e todo o capítulo é fruto de uma sociedade que a cada dia está deixando de existir, pois foi construído ainda sob o resquício de uma época que o povo sequer tinha o direito de discutir segurança pública, pelo fato de apenas ter direito a ficar calado, sob pena de ser agredido física e moralmente, época em que a censura ainda era o grande instrumento de alienação do povo, tolindo os meios de imprensa e não permitindo que a verdade chegasse aos ouvidos do cidadão. Aos governantes cabia a estratégia de manipular para governar.

Nossa Constituição avançou imensamente em muitas áreas, mas é claro que no tocante à segurança pública deixou muito a desejar, pois o capítulo a que nos referimos foi escrito por pessoas que à época militavam na área. Cabe-nos ressaltar que a sociedade brasileira não aprova o atual modelo que aí está. Já evoluímos muito após esses mais de 20 anos pós-constituição, e ao mesmo tempo sabemos que o mundo exige velocidade nos acertos de algumas questões e está se acostumando em acelerar essas mudanças nas sociedades que querem se modernizar e fazer parte do seleto grupo dos países desenvolvidos. Como entrarmos nesse grupo se porventura somos inertes diante de uma temática tão importante, cujos acertos e erros dizem respeito à preservação da vida, bem maior de qualquer se humano?

A política brasileira de segurança pública foi alimentada durante décadas por ingredientes que a tornaram extremamente ineficientes, e essa somatória sempre foi composta pela sinergia da compra de mais carros, armas e contratação de mais homens como forma mágica de solução dos conflitos urbanos. Necessário se faz entender que os lapsos de antagonismo a esse paradigma também existem, porém, em uma escala ainda muito diminuta, não sendo suficiente para passar a idéia de que esse atual modelo é obsoleto. Entretanto, não podemos deixar de entender que estamos avançando, mesmo que a passos lentos. A questão majoritária nessa discussão deve se apegar à quantidade de tempo que dispomos para mudar o sistema aí estabelecido. Parece que os resultados obtidos pelo emprego do atual modelo de segurança pública, até o presente momento, estão em níveis toleráveis, quando na verdade não estão. No entanto, quem faz essa avaliação são os mesmos que mantém e alimentam o atual sistema, aqueles cujo monopólio faz parte da sua própria sobrevivência. Daí o entendimento do porque a sociedade brasileira ainda não ter conseguido ecoar a sua voz com a intensidade necessária no sentido de exigir mudanças, o que na atual conjuntura está mudando com o advento da 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública, ocorrida na última semana do mês de agosto, servindo como base às autoridades políticas de que o atual sistema está insuportável, necessitando de profundas transformações, a começar pela inclusão de forma mais aprofundada dos municípios, que já pagam há muito tempo a conta dessa ineficiência.

Caminhamos hoje no sentido de fortalecer atores que, por incrível que pareça, desconhecem a sua própria força. O exemplo desenvolvimentista dos países democraticamente fortes traz o município como um dos protagonistas principais, capaz de contribuir com a modernização do sistema de segurança pública. Essa colaboração iria desonerar os estados federados da incumbência solitária em dar respostas a um problema que não é somente deles, mas de toda a sociedade brasileira. Quando o próprio preâmbulo do Artigo 144 da Constituição Brasileira menciona que “Segurança Pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos”, deixa claro que todos os entes públicos possuem responsabilidade com o tema, União, Estados e Municípios. Se esse entendimento fosse concretizado na prática, ficaria evidente a preocupação com o tema Porém iria ferir a maior das feras, que aqui chamamos de monopólio, que como guardião dos interesses adversos à solução da problemática, se alimenta das tragédias urbanas para exigir do povo mais recursos por meios de planejamentos incoerentes e ultrapassados, com base na lógica de que ao aparato repressor do Estado devemos dar todos os meios para proteger a sociedade, não importando quanto isso custe, afinal é o único existente Ou seja, falar em dividir tarefas seria o mesmo que ofender os gestores desse imenso monopólio. Toda essa engrenagem do sistema só fez crescer ao longo dos anos um modelo que pode ser comparado a um imenso paquiderme.

Imaginemo-nos entregues à sorte, nas mãos de um imenso elefante, que seja imensamente grande, pesado, lento, destrutivo e barulhento. Pois bem, o sistema de segurança pública brasileiro é lento e pesado ao se mover porque cresceu demasiadamente, fruto do resultado da política implementada ao longo dos anos por meio tão somente da compra de material bélico e da contratação de mais agentes; barulhento porque tem como pilar de sustentação a mídia por meio de programas sensacionalistas que se alimentam das tragédias diárias, tentando alienar ao máximo o povo com opiniões que vão do resultado antecipado do inquérito policial, oferecimento da denúncia e julgamento, tudo isso em uma única reportagem, ou seja, não se dá pura e simplesmente a notícia, se induz por meio do espaço jornalístico o que se quer, defendendo a causa que se deseja, o que no atual momento histórico é a manutenção do atual sistema de segurança pública que está ruindo, pois os donos do monopólio têm a mídia como parceira, até porque é nessa hora que surgem os grandes especialistas em segurança pública. Porém, a grande maioria aposentados, casuísticos e mantenedores de uma oligarquia que só interessa aos monopolistas do assunto, que sequer aceitam um debate olho no olho, sempre dando suas opiniões longe do contraponto e com o apoio de parte da mídia que busca holofotes com essa infrutífera parceria, cedendo seus estúdios a esses burocratas e negando espaço a outros profissionais da área.

Entretanto, basta nos aprofundarmos para sabermos que aprimoramos nossas instituições e temos hoje um Ministério Público atuante e um Poder Judiciário independente. Não precisamos da mídia para julgar as pessoas ou as instituições, induzindo o povo a pensar tão somente o que ela quer, não é a mídia que deve julgar e condenar. Nosso Estado Democrático de Direito já possui mecanismos legais para isso. Também não é a mídia sensacionalista que deve dizer quem deve atuar no atual sistema de segurança pública que o povo quer construir. O povo não tem compromisso com as oligarquias que foram estabelecidas por um regime ditatorial e que sobrevive até hoje com o apoio desses programas sensacionalistas ou direcionados. Precisamos muito da mídia para apontar o que não está funcionando bem, para que a verdade sempre apareça. O povo quer respeito e um pouco mais de tranqüilidade, não interessando quem lhe proporcione isso, desde que seja dentro da legalidade. Não nos cabe mais alimentar esse paradigma do desespero e da desesperança. Se ele continuar crescendo, o custo da sua ineficiência aumentará ainda mais e não poderemos sequer avaliar o tamanho do estrago que ele causará à sociedade brasileira.

Gilson Menezes
Diretor do Departamento de Segurança Urbana da cidade de Osasco
Pres. do Conselho Nacional das Guardas Municipais
Prof. do Ensino Superior
Pós Graduado em Segurança Pública

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